27.2.10

Ainda é festa


Dança, enquanto há no ar
fusas, semifusas e colcheias,
a romperem o silêncio.
Porque ainda é festa
mesmo que não pareça.
Dança, enquanto estão pintados
os rostos...
e os palhaços ainda estão em cena.
Por trás da coxia
Não é farta a alegria.
São mais humanos os palhaços.
Dança, enquanto são maleáveis
as articulações
E o corpo ainda obedece
aos teus passos.
Dança, enquanto há vivas e sorrisos
E mesmo que haja choro
Não te aflijas feito criança.
Tome a ti mesmo nos braços,
ouça o compasso...
E dança.


Frederico Salvo

20.2.10

Soneto sobre o nada


Não sei exatamente o que falar agora.
Portanto, resolvi escrever sobre o nada.
Começo retirando os minutos das horas;
Números, ponteiros, arranco e lanço fora.

Balanço cada página do meu diário
E junto meus poemas todos na lixeira.
Desmancho cada data do meu calendário
E guardo meus anseios vãos na geladeira.

Eu solto da janela as penas da saudade
E uma a uma apago as luzes do futuro.
No ralo do banheiro a razão atiro.

Enterro no quintal lembranças de amizade,
Depois na minha cama, no meu quarto escuro...
Deitado, fecho os olhos, esqueço e não respiro.


Frederico Salvo

8.2.10

Gula


Que Deus do céu a todos livre do incômodo,
Da infâmia que habita o bojo do pecado
De possuir o olho maior do que o estômago,
De ter esse apetite afoito, exacerbado.

Que dê misericórdia aos que passam fome,
Mas tenha mais ainda dos que não a tendo,
Enquanto há comida a vista, vão comendo,
Perdidos na madrasta ânsia que consome.

Que possa dar ajuda a tais impenitentes,
Pois mesmo sem ter nada encontram-se doentes:
Avançam no remédio e esquecem-se da bula.

Enfim, que possa dar-lhes a cura bendita
Cedendo a cada um a graça infinita.
Livrando-os do pecado vil chamado gula.


Frederico Salvo

6.2.10

Fato


Quem é que vai pagar o pato
Por esse prato tão vazio,
Por esses pés nesse chão frio,
Sempre carentes de sapato?

Quem é que vai mover a palha
E desbancar esse aparato,
Rasgar de vez esse contrato
Que injustiça atroz espalha?

Todos estão tão ocupados
Na proteção da própria pele.
Poucos atentam para o fato

Que não se isentam os culpados
De serem vítimas daquele
Que um dia foi brando e cordato.


Frederico Salvo